Imaginem um poço bastante largo mas de pouca profundidade. Agora imaginem esse poço cheio de serpentes. Centenas e centenas de serpentes de várias cores e tamanhos. De seguida, peçam à vossa imaginação que vos ofereça a imagem desse mesmo poço a ficar cada vez mais estreito e profundo. Enquanto isso, as serpentes vão-se matando entre si. No final, restará um poço bastante profundo e extremamente estreito, onde já só restam meia dúzia de serpentes vivas enterradas sobre centenas ou milhares de serpentes mortas. Eis The Shield! A série televisiva com o melhor anti-herói de todos os tempos. Ladies and gentlemen please meet Vic Mackey.
É estranha e talvez singular a minha relação com a música dos The National. Tudo começou com uma indiferença sem grande justificação. Às dicas de vários amigos fui avançando nos dias sem lhes ligar nenhuma. Uma música aqui, outra ali, mas sem entusiasmo que justificasse maior atenção. Ao longo de quatro anos (para aí entre 2003 e 2007) foi essa a minha relação com os senhores. Ou seja, praticamente nenhuma. Mas eis que, chegados a 2007, sai o apaixonante e desarmante Boxer. E aí... a minha rendição. Total. Daquelas que nos deixam sem saber o que fazer com o que agora temos em mãos, de coração ferido, e que culminou numa daquelas noites que se guardam por perto durante uma vida ou mais, numa Aula Magna rendida e hipnotizada. Tudo indicava um amor para toda a vida. Mas tal não aconteceu. E, poucos meses mais tarde, ao passar por eles num palco solarengo, já a antiga indiferença de novo me contaminava. Foi como reencontrar uma antiga paixão. Nem um palpitar. Talvez uma ligeira memória. Morna e apagada.
Entretanto, os anos passam e é anunciado novo disco. Entretanto, os meses passam e nada mais para além de uma audição desatenta. Por entre tantos elogios regresso ao início, ao princípio de tudo, onde nada encontro nas audições esparsas que me entusiasme o suficiente para retomar os arrepios vividos na anterior, tão intensa quanto curta, paixão. Entretanto, tudo isto, até hoje. Mas hoje, como um soco... de novo rendido. E agora?!
Masturbações nocturnas conjuntas. Uma jovem franzina de 16 anos que se apaixona por um avantajado homossexual de 43. Viagra natural arrancado da terra. Uma verga de meio-braço num homem demasiado velho para alguém. Ou talvez não. Sonhos que acabam por se revelar menos estranhos que a realidade de onde irrompem. Cuecas e sapatilhas em fuga num corpo de barriga enorme. Tudo isto e muito mais num filme único que, como todos os filmes únicos, não é melhor nem pior que os outros, é apenas diferente.
E lá pelo meio a jovem Hafsia Herzi que já tinhamos visto em O Segredo De Um Cuzcus. O enamoramento continua...
Celebremos! As cidades que se transformam novamente em selvas. E todos os homens que ainda resistem, não deixando de ser o que sempre foram... animais. [dançando freneticamente em câmara lenta] Foge da sombra que te apaga e aproxima-te da luz do candeeiro que te fique mais próximo. Qual lua cheia em noites de lobos uivantes na montanha em frente. Celebremos então! Os homens que ainda são e as cidades que voltam finalmente ao que sempre foram. [não olhes em volta procurando por quem não veio] E no final, antes de regressares, larga a pedra que trazias na mão e que entretanto esqueceste de usar.
Hoje, no café do costume, passavam cinco minutos das dez horas em que já é noite, quando a senhora afirmou bem alto e de forma clara, para quem a quisesse ouvir: "Eu não quero fazer amor!". Depois, chorou.
Um disco a inserir na categoria "discos que não mudam a história do mundo, mas que podem salvar uma tarde cinzenta". E depois viveram felizes para sempre. Mas isso é outra história. Que nunca aconteceu.
O público acordou tarde mas ainda a tempo para o concerto de uma banda a preto e branco, tão enérgica quanto limitada. Mas, duas horas mais tarde, dois encores e ouvidos a zumbir, a memória que fica é positiva. Amanhã, no mais adequado palco do Hard Club, será certamente melhor. Mesmo que um dos membros dos Black Rebel não saia de palco em lágrimas como aconteceu hoje.
Quando terminar um concerto, o melhor é aguardares meia-hora e ver o que acontece [ontem, por exemplo, o que aconteceu foi uma jam session surpresa de uma hora com guitarristas de Sun Araw e bateria que ia mudando de mãos... e até Scout Niblett se juntou à festa. E que bela versão do Range Life, dos Pavement, por lá se tocou. E que pena eu tenho de não ter gravado tal versão.]
[as minhas desculpas pela má qualidade sonora do vídeo]
Sim, já toda a música nos parece igual. E agora acrescentem à lista de afilhados dos Jesus and Mary Chain estes Rraaiillss, o projecto do californiano Adam Anderson. Já ouvimos isto antes? Sim. Tantas e tantas vezes. Mas ainda existem cópias suficientemente entusiasmantes que merecem ser ouvidas. Como este 1098, a ouvir muitas e bastantes vezes, como se fosse a primeira.
Em 1970 o Jim Morrison já sabia como seria a música em 2010. Eu arrisco agora dizer como será a música em 2040. Daqui a 30 anos (quem sabe mais cedo) a música será feita ao estilo Bimby. Uma pessoa coloca cinco ou seis músicas que goste num programa qualquer e... surge uma nova música. Os resultados dependem apenas da escolha de ingredientes feita por cada um.
Um dos discos mais aguardados para esta recta final de 2010, da dupla Tennis, tem uma das mais fantásticas capas do ano. Isso é já uma certeza. Só falta mesmo descobrir de que ano.